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À Sombra das Raparigas em Flor


O Instituto Superior de Educação Vera Cruz, através de seu curso de pós-graduação em Formação de Escritores e Especialistas de textos literários, apresentou ontem o Panorama Literário doISE, com uma aula magnífica do mestre José Carlos Souza.
Baseado na tese de mestrado desenvolvida por José Carlos, ele conduziu uma plateia de quase 40 pessoas ao mundo do intrincado e obscuro Marcel Proust.
Conforme ele mesmo disse,  Em busca do Tempo perdido é uma obra literária que não pode deixar de ser lida por quem ama escrever, ao mesmo tempo a obra é tão difícil, que “Marcel Proust é um dos autores mais vendidos e menos lido”.
Sobre este aspecto eu posso falar de minha experiência com o autor. Li “No caminho de Swann” quando terminava a faculdade de Publicidade, em 1987. O livro foi indicado pelo querido professor de psicologia Odair Furtado, que nos presenteava com nomes da literatura, até então desconhecido por nos como Proust, Kafka, Barthes, Bukowski etc.
Eu me lembro de que a leitura de “No Caminho de Swann”, salvo Ulisses, James Joyce, foi o livro mais difícil e complexo que li. Parágrafos longos, e digressões tão profundas, que ao final de uma página uma pergunta se fazia presente: - O que foi que eu li? Neste vai e vem, nesta leitura e releitura, a sensação era que Proust tentava trabalhar nosso sobconsciente de forma imperceptível. Depois desta experiência tão profunda e assustadora, nunca mais li nada do autor.
No entanto, depois desta aula magnífica, fica impossível não querer se aventurar novamente por Marcel Proust, principalmente quando se vê a obra sob o ponto de vista da criação literária.
José Carlos nos apresentou habilmente o percurso que este autor percorreu ao longo de sua vida em busca de respostas para seu questionamento “o que faz um bom escritor”. Foi-nos apresentado imagens dos manuscritos do autor que são incrivelmente confusos e possivelmente frutos de uma menta elaborada, não linear e extremamente criativa.
Proust escrevia seus textos metodicamente em cadernos, sempre do lado direito da página, deixando uma coluna em branco para futuras anotações. A página esquerda ficava vazia, aguardando pelas releituras e pelos incontáveis enxertos que ele fazia em seu texto.
Imagine alguém trabalhando assim, final do século XIX e inicio do século XX? Imagine um Editor recebendo o texto com dezenas de papeis colados, com inserções de trechos que, na visão do autor, não estava perfeito. Sim, por que não minha opinião, Marcel Proust buscava a perfeição.
José Carlos Souza apresentando uma imagem do manuscrito de
Marcel Proust. (FOTO: ISE)
Outro fato a ser lembrar em Proust é o lugar da memória na construção da obra literária. Não a memória como saudades e simples lembrança, mas como uma forma de apreensão do conhecimento. Memória como Cognição.
O que fica de toda a aula ministrada pelo mestre José Carlos Souza é que a construção da obra literária é algo que se faz em várias camadas. A primeira escrita nunca é a definitiva, por que apenas tangencia a profundidade do que queremos dizer. Talvez por isso Marcel Proust seja tão difícil de ler, por que contem tantos significados em um único parágrafo, que a meu ver, seriam necessários muitos anos para se compreender a obra como um todo. Talvez o mesmo número de anos que Proust levou para escrevê-la.
O Instituto Vera Cruz está de parabéns pela iniciativa. É muito bom, em dias de internet fácil e soluções simplistas, ver análises tão profundas e desprovidas de preconceito como a que faz José Carlos Souza.

A tese do autor pode ser consultada na Internet.
FOTO ISE

Crédito de Fotos: Instituto Superior de Ensino Vera Cruz.

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