Em meio ao caos e ao burburinho uma rua se abre para o sossego. Pode parecer impossível, mas um córrego de águas limpas corre por entre um fundo ferruginoso. É São Paulo?
Sim, uma São Paulo que se busca e
se esquece, uma cidade que brinca de esconde-esconde, um lugar que se desvenda
para quem ama boas surpresas. Como as árvores revolucionárias, que resistem ao
ar, ao vento, a construção de uma rodovia que, com certeza derrubou muitas
delas. Elas parecem nos dizer: “juntas somos mais fortes”. E você acredita no
que elas dizem.
Mais a frente, já adentrando ao
concreto, uma linha de Kalanchoes multicoloridos se enfileiram por uma calçada
estreita para o pedestre, mas farta de natureza e de beleza.
A cada olhar parece pulular algo
que chama atenção. Uma árvore que foi
esquecida pelas podas assassinas surge imponente, forte, contrariando a ideia
de que árvores velhas caem. Ela abre seu leque de folhas em um aconchego fresco
da sombra. Sussurra convidativa enquanto nos oferece um bom lugar para
descansar.
Estamos na City América, um bairro
residencial planejado para se viver na paz. Com suas casas suntuosas, que
desfilam estilos diversos, em cores que se espalham, em jardins bem cuidados.
Lá, naquele lugar mora um parque, um pedacinho do Canadá no Brasil.
O Parque Cidade de Toronto parece
nos convidar a reflexão. Fruto de uma
parceria positiva entre a Cidade de Toronto no Canadá e a Cidade de São Paulo,
o lugar é uma verdadeira festa para o gosto de quem ama plantas e a natureza.
Não é um lugar que vá abrigar grandes shows, nem grupos barulhentos, porque não há quase espaço para sentar-se, nem para um saboroso piquenique. A única churrasqueira fica escondida na parte de trás do parque, como se dissesse: - Silêncio! Lugar para meditação.
Caminho pela calçada com a sensação de quem entrou em outro mundo. O Pau Ferro imponente forma uma espécie de portal, ao lado do qual tem um banco de pedra. Banco que semanas atrás uma menina de 9 anos exibia seus trabalhos de bijuteria, com gentileza e vontade oferecia suas criações sob o olhar vigilante do pai orgulhoso. Como um sol ela me iluminou. E agora passo pelo portal e lembro-me daquele ser mágico. Seria uma fada?
Um pedacinho do Canadá nos encanta
com seus múltiplos Plátanos que gentilmente cedem suas folhas para forrar o
chão e avisam os mais desavisados que o outono segue seu caminho rumo ao ápice.
As cores e o aroma das folhas velhas caídas no chão me proporcionam uma
sensação de nostalgia, de memórias, como se a infância ou algo que nem sei se
aconteceu voltasse à mente e aquecesse o coração.
E, cortando o grande lago que refresca o parque, uma ponte em S serpenteia o lugar. Atravesso-a como quem pisa em algo sagrado. Olho o lago ou ele olha para mim? Vejo brancas aves que parecem ter vindo da paleta de um artista. Elas existem mesmo ou é meu olhar que as fazem existir?
Então, a magia se completa com uma borboleta. Bela, exuberante, negra e amarela sentada no gradil da ponte sinuosa. Aproximo-me e ela não foge. Pego e celular para uma foto e a borboleta parece nem se importar. Continua imponente observando o lago. Estaria vigiando o tecido da vida para corrigir qualquer pequeno rasgo que pudesse surgir? Sigo e deixo a linda borboleta com seus pensamentos.
Ao final da ponte vislumbro um
homem capinando a beira do lago. Não tenho certeza se vi o homem primeiro ou se
foi o aroma de mato cortado que me alertou. Pego o celular novamente para registrar
o momento e ele se vira. Parece que o tecido da vida o avisa que alguém estava
ali observando o movimento forte que ele exerce sobre a resistente moita.
Porque ele faz isso? Não me aventurei a perguntar.
Sigo feliz na caminhada realizada.
Já dizia o poeta que é ao andar que se faz o caminho. Ando na direção de mim
mesma a cada passo. Caminhar é encontrar-se, é sensibilizar-se, é o reencontro
que você se propõe a fazer com o universo que o cerca.
Saio feliz da experiência e faço
das palavras de Clarice Lispector as minhas:
“O tempo corre, o tempo é curto:
preciso me apressar, mas ao mesmo tempo viver como se esta minha vida fosse
eterna.”(1)
Fotos: Soraya Felix
1 - Clarice Lispector. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.
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