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O verde não conseguiu pular o muro

Quando estava na faculdade de Propaganda saía pelas ruas de São Paulo com minha Nikon FM para retratar curiosidades, uma sombra inusitada, um rabisco no muro, um prédio meio torto (Existiam muitos), tudo era motivo para transformar em arte. Eu fazia o que mais gostava como exercício do olhar, como uma forma de encontrar novas linguagens, novas formas de expressão. Naquele tempo, usava um bom filme em película, sempre preto e branco, e me encantava quando entrava no laboratório e via a imagem aparecer no papel. Era pura magia. Dentre pessoas, prédios, árvores, ruas vazias que fotografei, tem uma foto que marcou, que até agora povoa minha cabeça. Foi na simplicidade que encontrei a maior simbologia do que hoje, faz parte das grandes discussões mundiais. Era um domingo, a Avenida Paulista repleta de pessoas passeando (Ainda não tinham fechado a rua) e lá no alto, presa no concreto duro e robusto do prédio da FIESP pendia uma planta, solitária e resistente. No meio do concreto, q...
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Uma nova “arquitetura” universal

Engana-se quem pensa que o universo é feito de tijolos. Somos feitos de energia, e através dela vivemos, vemos, construímos e pertencemos ao Cosmos. Nada se perde nessa energia, nada se ganha, mas há a transformação. Ela se apresenta a nós por via das estações do ano, da borboleta que sai do casulo, da morte, da reciclagem de objetos, da estrela que vira pó, e espalha sua poeira no Universo; do pó das estrelas que compõe cada uma de nossas células. Você percebe que tudo e todos estão interligados? Que o ato de um pode atingir a totalidade? Quanta responsabilidade! Que força! Quanto poder de transformação! Os físicos sabem que tudo o que olhamos é um pedaço de realidade, que nada é sólido. Aquela poltrona linda e confortável, na qual nos sentamos e sentimos segurança, em um mundo subatômico está em movimento. Que a parede de nossa casa está dançando, e só a enxergamos sólida por um mecanismo de nosso cérebro. Que as cores das flores, dos objetos, das roupas, do cabelo não existem,...

A Biblioteca Humana: onde os livros respiram

Em Copenhague, existe uma biblioteca em que as estantes não guardam páginas, mas pessoas. Criada em 2000 por Ronni Abergel e outros colaboradores, a Biblioteca Humana (Human Library) nasceu com um objetivo ousado e simples ao mesmo tempo: transformar o ato de “ler” em um encontro vivo, onde a curiosidade encontra a empatia. Ali, o leitor não pega emprestado um romance ou um ensaio: pega emprestado uma pessoa. Cada livro humano é alguém disposto a contar sua história, partilhar sua experiência de vida, abrir-se como um capítulo vivo diante do ouvinte. Entre esses títulos encontram-se pessoas que já enfrentaram preconceito, exclusão ou julgamentos apressados: um refugiado, uma pessoa em recuperação do vício, um policial, alguém que vive com HIV, uma pessoa trans, um imigrante, alguém em luto. Cada encontro é uma oportunidade de derrubar estereótipos e ampliar horizontes. A metáfora é poderosa: ao abrir um livro humano, não há páginas para virar, mas sim pausas, olhares e palavras que...

O Mito de Sísifo

Empurrar uma pedra morro acima e vê-la despencar morro abaixo, tendo que reiniciar o trabalho sempre. Que atire a primeira pedra quem já não carregou a sua. Há livros que não apenas se lêem, mas se vivem. O Mito de Sísifo, de Albert Camus, é um desses encontros raros. Publicado em 1942, em plena Segunda Guerra, o ensaio parece dialogar diretamente com o nosso tempo, em que tantas certezas se esfarelam. Camus parte de uma pergunta simples e devastadora: vale a pena viver? Quando o mundo parece indiferente, quando nenhuma explicação última nos consola, o que resta? Camus chama de absurdo o choque entre o desejo humano por sentido e o silêncio do universo. Não se trata de provar que a vida é sem propósito, mas de reconhecer que o mundo não responde às nossas exigências de ordem. A tentação é buscar uma saída — um Deus que garante sentido, uma ideologia que promete redenção, um “amanhã” que justifique o hoje. Camus recusa essas promessas. Para ele, “não há amanhã”. E é exatamente aí qu...

O silêncio como linguagem na literatura

Há um instante, entre uma palavra e outra, em que o silêncio se abre como uma fenda luminosa. É nesse intervalo que a literatura respira. O silêncio, muitas vezes esquecido, é também linguagem: diz sem dizer, sussurra sem voz, ecoa na ausência. Os escritores sabem que o indizível é parte da vida, e que nenhuma frase contém tudo. Por isso, o silêncio aparece como gesto de confiança: o autor deixa ao leitor o privilégio de preencher o espaço em branco, de escutar o que não foi escrito. Hemingway escondia sob a superfície da narrativa um oceano de sentidos — e o que não se conta vibra mais forte do que o que se diz. Há silêncios íntimos, como em Virginia Woolf, quando uma pausa na consciência da personagem revela mais sobre a alma do que longos diálogos poderiam revelar. Há silêncios carregados de dor, como o intervalo entre duas frases em que se pressente o luto. Há silêncios que são resistência, metáforas erguidas contra a censura, palavras caladas que sobrevivem justamente por não ...

A cidade como personagem

Existem algumas memórias que me vem à mente sempre que penso nas cidades como personagem de nossas histórias. Um ônibus rodando rapidamente por uma estrada. Pela janela as paisagens passam como um filme em rotação acelerada. A cada agrupamento de casas você consegue destacar apenas um detalhe dentre tantos outros. Uma janela azul, um monte no meio do campo que forma um cupinzeiro, mas que pode se confundir com vacas, para quem não enxerga bem. As cidades, neste caso, são personagens latentes, chamando nossa atenção para que desembarquemos do ônibus e desbravemos suas ruas, ruelas e praças. Há a cidade da exposição, aquela que nos mostra que estes lugares a noite são pontos de luzes, que nos fascinam. Grandes cidades formam uma cúpula de luz, quase como se a iluminação fosse um escudo protetor. Do avião a vista é mágica. Milhares de pontinhos brilhando ao longe, como estrelas que decidiram descansar em terra. Que brilham como uma constelação chamada cidade. Tanta beleza não esca...

As muitas notas da música brasileira

A literatura infantil é a base da formação de um leitor. Precisa ser muito bem pensada para cativar um publico extremamente disperso e ao mesmo tempo curioso. É o gênero literário mais desafiante para um autor, porque precisa ser tão “pensado” que acaba sendo exaustivo a finalização de uma obra. Faz tempo que quero falar de literatura infantil pela importância da construção do futuro no hoje. As muitas notas da música brasileira, do jornalista Luís Pimentel, é uma iniciativa bem interessante para trazer uma linha do tempo da música brasileira para crianças e pré-adolescentes. O autor dá pinceladas de teoria musical como o nome das notas, a lei que exige o ensino de música nas escolas, os instrumentos músicas e a era do rádio. Quando ele passa pelo período que chamou de erudição peca pela escassez. Muito pouco de Vila Lobos e uma notinha pequena demais sobre a grande Chiquinha Gonzaga.   Faltou profundidade, já que o Clássico é sempre a base para toda a forma de música. De...

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