Há formas e formas de se estudar uma época. Os livros de história tradicionais nos levam de volta aos bancos escolares, com o maior crime que se pode cometer: - achar que se conhece história por que decorou datas.
Há ainda uma forma bem mais inteligente e instigante que nos leva a uma viagem através dos olhos de uma família ou da sociedade.
Edmund de Wall, um ceramista consagrado, nos leva a segunda forma de entender a história através das páginas de A Lebre com Olhos de Âmbar (Ed. Intrínseca).
Inteligente, instigante, fascinante, Wall nos conduz pela Paris do final do século XIX, por Viena, Tókio e Londres sob os olhos de seus familiares: - os Ephrussi.
264 miniaturas japonesas – netsuquês -, esculpidas em marfim e madeira, herdadas de seu tio-avô são o leitmotif da história. No entanto, o que poderia ter sido apenas um amontoado de relatos monótonos sobre a coleção se expande de forma brilhante em uma história que nos leva a uma Paris pululante de artistas, mas recheada de preconceitos, a uma Viena cuja glória foi construída pelos judeus, que de repente viram o anti-semitismo crescer durante a Primeira Guerra.
É chocante se deparar com a informação que o grande pintor Degas,cujas delicadas bailarinas são sua maior representação, tinha tendências anti-semitas. Mais absurdo ainda é descobrir que um “maluco” escreveu um livro de vendeu 100 mil cópias em um ano, também com fortes declarações contra os judeus – Edouard Drumont, e seu livro chamava-se “La France Juive”.
Então, você passa o livro todo se perguntando o porquê de tanto preconceito e torce para ter um tempo para correr até uma livraria e comprar uma História do Povo Judeu, para compreender um pouco mais.
Também é espantoso descobrir que na Paris do final do século, amantes eram absolutamente normais. Homens e mulheres tinham suas famílias tradicionais e seus amantes. Os encontros se davam nos incontáveis Salões – locais nos quais as pessoas se reuniam para dançar, conversar sobre política, poesia, literatura, e ter encontros secretos. – Também se encontravam nas casas que vendiam coleções de arte. Na época, o japonismo era a moda. Carregamentos vindos do Japão eram a desculpa para tais encontros.
A parte que relata Viena especificamente nos faz sentir-se diante da tela de um cinema cujo filme começa a passar cenas em sequência que vão de uma Viena abundante a uma Viena destruída, empobrecida e envenenada pelo preconceito. A descrição é tão bem feita que você “enxerga” as cenas.
A Lebre com Olhos de Âmbar é um livro para ser lido do começo ao fim sem descanso e compartilhado com as outras pessoas através de presentes.
Melhor que ler um bom livro é poder, sem dúvida, conversar sobre ele. Pode ter a certeza que a história de Edmund de Wall pode nos proporcionar meses de um bom bate papo.
Ainda não tive oportunidade de ler esse livro, mas um fato é indiscutível, o que hoje é história foi intensamente vivido num dado momento, então não pode ser aprendido apenas como descritivo de fatos e datas. Com certeza, uma "estória" pessoal,contada a partir de um observador atento que tenha vivenciado o período passará muito mais informações, conceitos, fatos que são abrigados por sentimentos e emoções e,... assim, não é possível esquecer o que ouvimos. Esse é o verdadeiro aprendizado.
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