Pela primeira vez, desde que criei este blog, fiquei horas
sentada diante do computador pensando em como descrever em palavras a sensação
que a leitura de “Réquiem:sonhos proibidos”, livro de estreia de Petê Rissatti (Editora Terracota),
me proporcionou. Vencida pelo óbvio de que a tarefa era impossível, já que só a
leitura do livro daria a exata noção da história, coloquei mãos a obra para
desvendar o que me era permitido.
Quando o Petê publicou que iria lançar um livro e junto dele
o resumo da trama fiquei muito curiosa. Sonhos sempre foram a minha paixão, e
Freud e os pintores surrealistas minha obcessão. Então, obviamente fiquei
contando as horas para ter o livro em mãos. E não me decepcionei.
O livro de Petê é fluido, absorvente e como, a meu ver, todo
romance deve ser: - impossível de largar sua leitura até o fim. É claro que não
fiquei surpresa. Já tinha ouvido outras histórias pequenas de Petê, além de
acompanhar seu blog e nenhum deles deixava dúvidas a respeito do que seria seu
primeiro livro. Mas, tem muito mais.
Tradutor da difícil e complexa língua alemã, e como tradutor
de obras ele acaba sendo co-autor de cada uma delas, aprendeu muito bem as
lições de nossos mestres alemães. Então você encontra parágrafos longos demais
para a língua portuguesa, mas extremamente adequados ao tom da história. Seus
personagens são densos, pesados muito próximos dos que já encontrei em Franz
Kafka (O Processo) e um pouco de Dostoiévski (Ivan me lembrou de Aliocha). Não
que ele seja igual a eles, não, mas há algo deles no livro.
À primeira vista a obra me pareceu cíclica, como alguns
sonhos que nos atormentam em noites agitadas, mas não. Se bem observado, Petê
Rissatti construiu Réquiem de forma espiral ascendente, que o leitor poderá
perceber claramente no último capítulo, nos pequenos detalhes do
cotidiano-máquina de Ivan. Sinceramente espero por uma continuação da história.
A trama é simples. O mundo é controlado por lideres malucos que
resolvem proibir as pessoas de sonhar e as dopam com uma droga chamada RÉQUIEM.
Ivan, nosso protagonista, é um
funcionário público pacato e totalmente adequado as regras ditatoriais do
governo. Um dia, e isso acontece no inicio do livro, ele se esquece de comprar
um novo estoque de Réquiem e acaba sonhando. Depois deste sonho, a vida de Ivan
se transforma e ele vai descobrindo fatos e sentimentos sobre si mesmo que
desconhecia.
Quem o ajuda nesta jornada são os Sonhadores, um grupo
revolucionário que deseja, em resumo, devolver o bem mais caro que possuímos: -
a liberdade. Não dá para detalhar muito a trama sob o risco de publicar
spoilers.
Agora a experiência de leitura foi fantástica, já que lendo
Réquiem, Petê me fez lembrar de livros que fazem parte da minha lista de “os
melhores”. Quando descobri que a história toda girava em torno da droga
Réquiem, ficou impossível não ser remetida ao SOMA, do fantástico “Admirável
Mundo Novo, Aldoux Huxley”. Os cinco lideres, esses fanáticos dominadores me
levaram novamente ao mundo de “1984, de George Orwell”; No entanto, o que mais
encantou foi a aproximação com o mundo distópico de “Fahrenheit 451, de Ray
Bradbury”, e isso não foi espantoso já que Réquiem inicialmente era um conto de
uma publicação que referenciava esta obra.
Agora talvez alguém se pergunte o porquê do mundo dos sonhos
ser proibido? Talvez você tenha perguntado o porquê do amor, ao ler Delirio, de
Lauren Oliver? E a resposta não é simples, mas possível.
Sonhar, assim como amar, é um dos atos mais livres, mais pessoais e
incontroláveis que o ser humano é capaz de produzir. Há um senso comum que
afirma que o pensamento não pode ser controlado. Eu discordo. Há formas de
controlar. Mas os sonhos, aquilo que acontece conosco quando colocamos a cabeça
no travesseiro e fechamos os olhos, eles são independentes e ricos, e dizem
muito sobre nós. Controlá-los significaria nos transformar em zumbis, em seres
teleguiados.
O final é surpreendente. Petê Rissatti conseguiu nos tirar
do lugar comum, mas também conseguiu uma pequena ponta de – Por quê ele fez
isso com Ivan? – Depois fica claro que o final não poderia ser outro, talvez
por que o próprio livro seja o anti-réquiem do leitor.
Confesso que fiquei com gosto de quero mais, e espero
sinceramente que ele lance uma continuação. Quero entender como o Governo sabia
quando as pessoas sonhavam. Rastreadores? Alguma coisa colocada na própria
droga que avisava quando alguém não a tomou? E, se o Governo podia rastrear
quem sonhava, como não conseguia encontrar os “Sonhadores”, que por definição
sonhavam todos os dias? Tenho certeza que serão perguntas que uma parte dos
leitores farão ao terminar Réquiem.
O que mais eu posso
dizer sobre ele? Que foi um dos melhores livros que li este ano e que o autor
tem um futuro brilhante pela frente e um dos motivos é que a literatura de Petê
é universal, o que significa que sua obra faria sucesso traduzida para o inglês
ou alemão, não deixando nada a dever para os autores atuais dessas línguas.
Eu repito a proposta que gosto de fazer a meus leitores:
- Leiam de depois me escrevam. No meu caso Réquiem já está na lista de releituras.
Onde Comprar: Livraria Cultura
Muito obrigado, Soraya.
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