Não adianta tentar “caçar” um
ghost writer, eles nunca se mostrarão nem a luz do dia, nem da noite. Mas eles
podem estar escondidos na biografia maravilhosa que você acabou de ler, naquele
famoso best seller de auto ajuda que está na mídia há meses ou quem sabe
naquele livro técnico que você comprou para compreender um assunto de sua área
profissional. Você não sabe e nem nunca saberá.
Nanete Neves é um destes seres,
que povoam as prateleiras das livrarias com seu talento, técnica, paciência e
por que não dizer, desprendimento.
Formada em jornalismo e
pós-graduada em Formação de Escritores e Criação Literária, Nanete já publicou
quase 20 livros de não ficção para editoras como Campus Elsevier, Larousse,
Planeta e Saraiva, todos como ghost writer.
Mas ela também assina seus
próprios livros como o Lavoura Dourada, um livro-reportagem que fala sobre a
saga dos produtores de tabaco do Sul do Brasil dentre muitos outros.
Conheça um pouco da profissão de
Nanete e da apaixonante entrevista que deu ao Prosa Mágica.
SF. Eu vi você falar com paixão
sobre sua profissão em uma palestra. Você poderia nos explicar o que é um ghost
writer e como ele trabalha?
NN. Tenho mesmo paixão por tudo
que se refere à literatura, leitura e escrita, e por isso eu me capacitei para
estar preparada. Quando a vida me abriu a primeira oportunidade, eu me agarrei
a ela e atuo nesse mercado desde 2005. E um ghost nada mais é que um
profissional contratado para tornar reais projetos de livros de não ficção. A coisa
funciona mais ou menos assim: as editoras convidam determinadas personalidades
que têm o que dizer para fazerem seus livros. Quando esses “autores” não têm
tempo para isso ou simplesmente têm dificuldades em escrever, as editoras
oferecem um ghost para ajudar na tarefa. Ele é um profissional altamente
capacitado para transformar o conteúdo daquele autor em linguagem. E mais: todo
ghost tem que ser um editor. As editoras pagam muito bem por isso, mas ao cabo,
esperam um livro absolutamente pronto, editado e já aprovado pelo “autor”.
SF. Um escritor deseja o
reconhecimento do seu público. Você pode nos explicar como é esta relação de
ser invisível e ao mesmo tempo ser escritora. Por que você escolheu ser um
ghost writer?
NN. Gosto de contar histórias,
mesmo que sejam as dos outros. Venho do jornalismo, onde aprendi a tirar as
informações das pessoas, a pesquisar, a seguir minha intuição e, sobretudo, a
escutá-las com atenção. Isso tudo ajudou a me aperfeiçoar como ghost, me dando
agilidade e uma boa margem de acerto na hora de redigir e editar.
Atuo como ghost writer com o
maior prazer e isso é muito sincero. Não me sinto autora dessas obras porque eu
não vivi aquelas vidas nem acumulei aqueles conhecimentos. Aqueles livros são
deles. Eu apenas transformei em palavras o que queriam dizer, no tom e no
timbre de cada um. Aliás, esse é o maior desafio para todo ghost. Ganho por
empreitada, e bem aliás, uma vez que essa é uma atividade muitíssimo bem
remunerada. Nessa função, o reconhecimento dos autores e das editoras já me é
suficiente. E, quando tenho o que dizer e quero contar minhas próprias
histórias, parto para fazer a minha própria ficção. Simples assim. Meu ego é
resolvido.
SF. Há formação específica para
ser um ghost writer? Qual?
NN. Na época em que comecei não
havia curso algum no Brasil voltado para essa capacitação, então tive que
aprender sozinha, ralando e estudando muito. Fui ouvinte e aluna especial de
várias matérias na pós-graduação da ECA- Usp, e fiz duas especializações na
área de literatura. Mas esse conhecimento não seria suficiente se eu não fosse
uma leitora assídua e crítica. Costumo dizer que só quem lê é capaz de escrever
bem.
Muita gente me pedia dicas e
orientação até que, em 2011, sentindo esse vácuo no mercado, aceitei o convite
da Rosângela Petta, diretora da Oficina de Escrita Criativa para formatar o
curso de Biografias & Ghostwriting. Ele é semestral e visa capacitar
profissionais para esse mercado cada vez mais em expansão.
SF. Em linhas gerais um ghost
writer pode escrever qualquer gênero, como a ficção, ou o trabalho acaba sendo
específico dentro de áreas como a biografia, trabalhos científicos e técnicos?
NN. O ghost atua unicamente no
seguimento da não ficção, em vários gêneros: livros de memórias, autoajuda,
autoajuda empresarial, didáticos, autobiografias, trabalhos científicos,
técnicos, discursos, artigos para jornal, etc. É possível trabalhar como o Ewan
McGregor naquele filme O escritor fantasma, contratado para escrever o livro de
um político. Já aquele tipo de ghost que Chico Buarque criou em seu livro
Budapeste é pura ficção.
SF. Você conhece alguém que
escreve ficção como ghost writer? Pode citar o nome.
NN. Essa pessoa não existe, e se
existir não pode ser um bom escritor e muito menos sério. Porque, se ele fosse
mesmo bom, já teria se lançado como autor de livros de ficção.
SF. Qual é o gênero mais difícil
de escrever para um ghost writer?
NN. Depois que se pega
experiência, nenhum gênero é difícil. Basta ouvir o autor com atenção, e estar
disposto a aprender sobre aquele tema. É o autor que tem que dominar o assunto,
não o ghost, entende? Por isso ele foi convidado pela editora a escrever um
livro, e não o ghost.
SF. Quem você considera o maior
ghost writer na história?
NN. Não sei se daria para
responder isso porque essa atividade, embora antiga, por muitos anos viveu
cercada de mistério. No mundo todo, grandes escritores trabalharam como ghost
writers como profissão paralela. Aqui no Brasil muita gente boa exerceu (e
continua exercendo) essa atividade, mas prefere não divulgar. Basta entrar numa
grande livraria, olhar aqueles livros todos nas prateleiras e se perguntar:
tanta gente assim saberia escrever, de fato, um livro?
Mas tivemos, por exemplo, Autran
Dourado e Clarice Lipector que sempre admitiram. Atualmente essa atividade já
está começando a perder a mistificação e grandes presidentes de empresas
(autores de livros) já falam entre si: “Vou te apresentar a minha
ghost”...rs
SF. Você poderia citar algum
livro que escreveu? Quantos livros você escreveu como ghost writer?
NN. Por questão de contrato, não
posso revelar publicamente os livros que ajudei a tornar realidade, mas já
estou beirando o vigésimo, vários já em segunda ou terceira edição, o que é
prova que funcionaram bem. Tenho o maior orgulho de todos eles.
SF. Como está o mercado para a
profissão no Brasil? E no Exterior?
NN. Está em franco
desenvolvimento, basta saber que os dois gêneros mais vendidos aqui são
autoajuda e biografias. As pessoas gostam de saber das histórias de seus
ídolos, pois isso as estimula a crescer e a se superarem, e isso não vai mudar.
Assim, cada vez mais as editoras vão precisar contar com um bom cartel de
ghosts eficientes. Por isso, cada vez mais aumenta a procura por esse tipo de
capacitação. O mesmo acontece nos outros países.
SF. Em média, quanto ganha uma
ghost writer?
NN. Não posso falar de valores,
até porque os preços variam de acordo com o grau de dificuldade e o tempo a ser
despendido em cada livro, mas garanto que um ghost writer experiente trabalha
muito duro, fica meses e meses trabalhando direto sobre uma obra, mas ganha
muito bem por isso.
SF. O que você aconselharia para
um escritor que deseja trilhar o caminho do Ghost writer?
NN. Primeiro, resolva seu ego.
Segundo, leia, leia muito, mas leia como escritor, tentando ver como os autores
estruturaram as suas narrativas. Terceiro: estude, capacite-se. E quarto:
divirta-se, porque você só conseguirá ser feliz nessa profissão se gostar mesmo
de escrever e mergulhar na vida do outro.
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