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A Filha da Feiticeira



Título: A Filha da Feiticeira

Autor:  Paula Brackston

Tradutor:  Fal Azevedo

Editora: Bertrand Brasil

Ano de Lançamento: 2013

Número de páginas: 448

Avaliação do Prosa Mágica: 9





Às vezes, escolher um livro pela capa nos traz agradáveis surpresas. Quando eu vi a Filha da Feiticeira nas livrarias fiquei encantada com a simplicidade e ao mesmo tempo comunicabilidade da escolha da capa. No entanto, como dificilmente eu faço uma compra na hora, o nome ficou arquivado.
Outro dia, uma amiga me indicou uma série de livros focados no assunto magia e dentre eles estava A Filha da Feiticeira. Foi a senha para que eu comprasse o livro.
A trama transcorre entre 1627 e 2007, e conta a saga Elizabeth Anne Hawksmith, uma adolescente que foi introduzida no mundo da magia pelo mago Gideon e que passou o resto de seus dias, perseguida por ele. Ele a desejava como companheira, como a feiticeira que dividiria os poderes com as artes do mal.
Elizabeth, herdeira de uma longa linhagem de mulheres que se utilizam da arte da cura se recusa a usar sua magia para o mal, e por isso vive uma vida solitária, marcadas por perdas, inclusive de sua mãe, que foi morta pela inquisição. Além disso, a autora mesclou a estória fantasiosa de Elizabeth com fatos históricos como a inquisição, a primeira guerra mundial e Londres, em plena transformação e cercada pelo mistério de Jack o estripador.

Paula Brackston acertou o tom de seu livro de estreia. A narrativa se desenrola em um vai e vem temporal, sempre contado pela protagonista. No presente Elizabeth conta o seu relacionamento com a adolescente Tegan, que será introduzida no mundo da feitiçaria. Na verdade Tegan é o primeiro ser humano que a feiticeira deixa se aproximar de uma forma mais direta, sem as defesas costumeiras.
Ao longo da jornada das duas personagens você percebe que Tegan, aos poucos, começa um processo de cura em Eliza, uma processo que traz um novo alento a quem precisou viver séculos sozinha. Por outro lado, a própria Tegan se deixa ser conduzida, e a autora nos mostra declaradamente o crescimento de uma adolescente que parecia ser ignorada pela própria mãe.
É no presente que se apresentam as maiores mudanças e também as cenas mais belas e terríveis de magia. É no treinamento de Tegan, que Paula Brackston acertadamente utilizou suas pesquisas sobre as Wiccas que a magia da feiticeira nos encanta.

A história no passado é ambientada em três lugares diferentes:

Fazenda em Batchcombe, UK
Primeiro ela transcorre em Batchcombe, no condado de Wessex, entre os anos de 1627 e 1628. Lá, a autora nos apresenta a belíssima família Hawksmith. John, pai da protagonista, um homem trabalhador que cuida de sua pequena fazenda com a ajuda dos filhos. Thomas é o filho mais velho, Margareth a mais nova e Anne, uma mãe zelosa que traz em sua família a tradição da cura, e é chamada constantemente pela população do povoado para curar doenças, fazer partos. Enfim, uma família respeitável.
Tudo muda quando a Peste invade a cidade e começa a ceifar vidas. É neste momento de desespero e de completa descrença, que as pessoas começam a procurar por respostas que não existem. Então, Anne que antes era uma pessoa respeitada, agora é tratada como bruxa por uma inquisição levada pela ignorância de um povo desprovido de memória.
É nesse momento que Paula Brackston nos mostra seu talento ao equilibrar muito bem a fantasia com a realidade histórica vivida em tempos de caça as “bruxas”.
É neste momento que ela nos apresenta o enigmático Gideon, um homem que todos desconfiam, mas que Anne escolhe como guardião de sua filha.
Gideon é um mago astucioso, ligado às artes das trevas. Ele ensina Bess (Elizabeth) a ser uma feiticeira, mas a adolescente, mesmo que encantada inicialmente por este homem, acaba renegando tudo o que ele ensinou quando o vê as voltas com coisas do demônio.
A perseguição de Bess, tornada imortal pelas mãos de sua mãe, começa neste momento.

Londres 1888
O segundo cenário é uma Londres de 1888, um lugar repleto de pessoas e cercado das mazelas que assolam as grandes cidades em momentos de grandes mudanças. Eliza (Elizabeth) é uma médica, assistente de um famoso cirurgião, o Dr. Gimmel, instalada em um grande hospital. Lá, Eliza enfrenta, não só as intempéries que as doenças apresentavam nesta época, como também o preconceito de colegas de trabalho que não admitiam mulheres como médicas, e muito menos cirurgiãs.
É neste cenário que Eliza tentará mais uma vez viver uma vida comum, construir o bem e usar seus poderes de cura para ajudar as pessoas, no entanto, mais uma vez, Gideon a encontra e põe seus planos por água abaixo.
É impressionante a descrição dos personagens de época, das ruas, das situações, inclusive da citação do famoso Jack Estripador, que matou muitas mulheres. A habilidade da autora de nos confundir com história e fantasia é tão grande que você chegará a pensar que Jack é Gideon, mas como tudo em Paula Brackston, nada pode ser concluído apressadamente.

Batalha de Passchendaele

O terceiro cenário é em Passchendaele, Flandres, em 1917. Aqui, a autora utiliza-se da famosa Batalha de Passchendaele, na Primeira Guerra Mundial na qual os britânicos e seus aliados lutaram contra o império alemão.
Agora Elizabeth é uma enfermeira que vai trabalhar no hospital de campanha em Saint Justine, e lá se depara com os horrores da guerra, com a morte iminente, com a falta de recursos para salvar vidas e com a dureza dos campos de guerra.
Lá, Elizabeth é enviada a um posto de assistência próximo ao campo de Batalha, e é neste lugar que ela começa a compreender a importância de seus poderes e o sentido da verdadeira coragem.
É claro que a autora não dará uma oportunidade real a nossa protagonista, que mais uma vez é obrigada a fugir, só que desta vez deixando um grande amor, alguém que a compreendeu e por isso mesmo foi morto pelo terrível Gideon.

Os personagens são muito bem construídos, o que torna muito fácil acreditar neles, vou citar apenas dois deles já que Elizabeth tem sido falada ao longo de toda a resenha.

Gideon se apresenta como um homem sedento de poder, sem limites para o que é moralmente aceitável ou não. É uma espécie de Dr. Fausto, de Marlowe, sem o final terrível de sua alma sendo levada pelo diabo. A impressão é que a autora desejou nos fazer esta conexão, como se “levar a alma para o diabo” não fosse o melhor castigo. Gideon é punido pelo bem.

Tegan é a típica adolescente da atualidade, cuja solidão se dá pelo total descuido dos pais. Ela parece viver sua vida como alguém que não existe, alguém cuja voz não é ouvida nem pela própria mãe, e que encontra em Elizabeth o apoio e o amor que tanto necessita. Ao olhar para Tegan, há uma necessária aproximação dela com Margareth e dela com a filha que Elizabeth nunca teve.

Não me permiti ler A Filha da Feiticeira com a velocidade que costumo fazer leituras. Esta trama precisa ser degustada aos poucos. O leitor precisa sentir os cenários, intuir o drama que pesa sob Elizabeth e só depois de tudo muito digerido, é que um retorno à época atual é possível.
Ai sim, você pode voltar à leitura e seguir até que outro drama do passado se desenrole e você precise reduzir a marcha novamente.
Paula construiu um livro que explora as mais profundas camadas do subconsciente. Você literalmente se sentirá escavando as profundezas do inconsciente da protagonista até que ela finalmente se compreenda e só assim encontre a fórmula de sua libertação.
É um livro fascinante que eu realmente recomendo.


Livros relacionados:
A Descoberta das Bruxas – Deborah Harkness
A Filha da Floresta –  Juliet Marillier
The Winter Witch – Paula Brackston (A Ser lançado no Brasil)

Resenhas que valem a pena:

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