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Confissões de um Jovem Romancista

Aqui está um livro que eu gostaria de ter lido anos atrás, mas que só surgiu uma oportunidade agora. Estou feliz por ter feito isso neste momento.

Feliz porque estou em um movimento de muito aprendizado em dois cursos incríveis, um deles sobre a construção do Romance  e o outro que é basicamente marketing, etapas de processo de produção, redes sociais etc. Mas, vamos ao assunto desta postagem que é Umberto Eco.

O autor é um fenômeno, não só pela sua capacidade infinita de romancista, mas também porque ele vem da área acadêmica e escreveu seu primeiro romance somente nas proximidades dos 50 anos.

O Nome da Rosa, auxiliado pela versão cinematográfica, foi um grande sucesso, e os leitores de forma inacreditável encararam trechos de discussões teológicas, que ultrapassam cinquenta páginas. Um fenômeno.

Depois dele vieram muitos outros como O Pêndulo de Foucault, O Cemitério de Praga, Zero, Baudolino dentre outros, que rechearam os mundos de quem ama boa literatura.

Para nosso prazer intelectual, Umberto Eco lançou Confissões de um jovem romancista, um livro composto por quatro ensaios que foram incluídos como parte do programa de palestras Richard Ellmann sobre Literatura Moderna, na Universidade Emory nos Estados Unidos.

Mesmo em face de o autor ser um grande filosofo e linguista, ou seja, possuir um conhecimento sem limites em áreas acadêmicas complexas como a semiologia, o texto do livro é leve, bem humorado e indispensável para quem quer ser um escritor.

No primeiro ensaio "Escrevendo da esquerda para a direita", Eco nos apresenta sua “veia humorística”, já que o ensaio inteiro parece ser uma resposta aos jornalistas que sempre lhe perguntaram “Como você escreveu seu romance?”. Neste ensaio ele nos apresenta a importância do esforço em detrimento à inspiração, que todos nós escritores sabemos ser necessária, mas para quem lê dá uma sensação de que “baixou uma história no escritor”.

No segundo ensaio, "O autor, o texto e os intérpretes", Umberto Eco fala sobre as diferenças entre a intenção do autor, do leitor e do texto. Como exemplo ele se utiliza de obras como "Finnegans Wake" de James Joyce. É muito importante a reflexão que ele faz sobre os limites da interpretação. O autor afirma que:

"Todo ato de ler é uma complexa transação entre a competência do leitor e o tipo de competência que determinado texto postula para ser lido de um modo 'econômico' — significando uma maneira que aumente a compreensão e o prazer do texto, e que seja corroborada pelo contexto (...)"

Muito se tem discutido sobre isso hoje em dia. O livro depois que sai das mãos do escritor já não é mais o mesmo. O leitor interage com ele e dá sua interpretação de acordo com sua bagagem emocional, cultural, econômica etc. Umberto Eco se preocupava em adequar a linguagem para que o leitor não fizesse interpretações erradas, porque existe um limite entre a interação com a obra e o desvio do que foi escrito.

O terceiro ensaio "Algumas observações sobre os personagens fictícios", em minha opinião, é o mais complexo porque exige do leitor um conhecimento prévio das obras citadas para que se faça a compreensão exata do que ele está dizendo.

Neste ensaio ele tenta nos explicar porque, de certa forma, nos importamos mais com os personagens de ficção que as pessoas da vida real. Para Eco (E eu concordo com ele) os escritores criam personagens de carne e osso, pessoas que evocam nossa empatia, que nos fazem chorar, rir, torcer, se apaixonar.

Na última parte do livro "Minhas listas" ele enumera vários exemplos de literatura para evocar o poder da palavra. É forte, contundente e de certa forma uma lista de indicações para que você possa tomar contato diretamente com a boa literatura.

O que eu posso dizer sobre o livro é que ele é muito bom. Umberto Eco é alguém que conhece tão bem o que esta falando, que torna fácil e leve o aprendizado.

Recomendo a leitura para romancistas e para quem quer compreender um pouco mais o mundo em que os escritores vivem.

 

Autor: Umberto Eco

Tradutor: Clóvis Marques

Ano de lançamento: 2018 (esta edição)

Editora: Record

Gênero: Teoria e Crítica Literária

Páginas: 154

Avaliação Prosa Mágica: * Clássico

Comentários

  1. Eu li O Nome da Rosa e gostei muito, inclusive vi o filme algumas vezes. Realmente é o tipo de escritor que todos gostariam de ser um dia. Leitura cativante, intrigante e de fácil entendimento. O livro que você comenta no blog eu não conheço, mas vem a calhar neste momento. Obrigado pela publicação e pela sugestão. Vou dar um jeito de consegui-lo, Vai me ajudar no meu projeto,.

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    Respostas
    1. Obrigada por comentar Paraiso Latino. Eco é incrível e seus livros são repletos de um tipo de leitura que parece estar em desuso hoje em dia, o ler intelectual.
      abraços

      Excluir

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