Pular para o conteúdo principal

A vida é um poema


Quando penso em poesia, sempre me vem à mente uma profusão de imagens que se sobrepõe em camadas, como uma boa pintura, que aos poucos vai formando um sentimento que se fixa, mas não se explica.

Complexo e ao mesmo tempo simples. É como olhar um bosque cujos planos se completam com árvores, flores, pássaros, riachos, céu, o ar que dança por entre as folhas, os pequeninos insetos que volteiam nos espaços livres. O olhar não se detém nos detalhes, não de inicio, mas o todo nos provoca emoções, muitas vezes inexplicáveis em palavras.

Poesia é isso. É emoção, é frequência e conexão.

Quando penso na expressão poesia sempre me vem à mente o famoso haikai de Bashô (Furu-ike/ ya / kawazu/ tobi-komu / mizu-no-o-to)

Velho lago,

Uma rã que mergulha,

ruído d’água.

Na simplicidade de um cenário que nos apresenta um tanque, em algumas traduções “pequeno lago”, Bashô nos leva ao momento que olhamos para o tanque e vemos rapidamente o rã pular. Qual é a forma e a cor daquela rã? Não sabemos, fica apenas a sensação de calma e conexão ao ouvir o Tchibum.

O Haikai é puro sentimento, é conexão com a natureza e talvez não haja nada hoje em dia mais conectado com o assunto do momento: Sustentabilidade e os riscos de destruirmos o planeta.

Mas o sentimento está em qualquer outro lugar e autor. A língua portuguesa é farta de grandes poetas que nos envolvem com seu romantismo, com seu realismo excessivo ou com sua forma descontraída de nos levar a outros patamares.

Outro dia assisti a live de apresentação de um curso que iria se abrir Mínima Linha Infinita sob o comando de duas cabeças incríveis Tiago Novaes e Tarso de Melo. O assunto era poesia, e é claro, elevada a décima potencia. Na live Tarso citou o livro “A Trama da Vida: como os fungos constroem o mundo” de Merlin Sheldrake que aparentemente não tinha nada de poético, mas quando você lê percebe que assim como o Haikai, a poesia está em tudo.

“Olhei para o topo da árvore. Samambaias e orquídeas brotavam no tronco, que desaparecia na copa dentro de um emaranhado de lianas. Bem acima, um tucano saltou de um galho com um grasnido, e um bando de bugios roncou. A chuva tinha cessado, e as folhas derramavam gotas pesadas em chuveiradas repentinas. Uma névoa pairava sobre o chão.”(1)

O nosso desafio diário deveria ser o de ver poesia em tudo o que olhamos e fazemos. Poetas escrevem sobre o amor e sobre o encantamento, mas também colocam no papel sua dor e seu pesar. Neste caso, a poesia serve como uma ponte do transformar.

Meu desafio de hoje, para você querido leitor e leitora, é que faça poesia em sua vida. Que seu olhar encontre a beleza nos lugares mais inusitados, nos lugares fora dos moldes impostos pelo social.

Afinal, se não há rãs onde você mora, há folhas que caem com o vento, há pássaros que cantam em qualquer horário, há a gota de água presa nas grades da varanda do apartamento. Ela reflete o céu em sua ponta e o chão na parte que ainda se toca com a grade e de repente ela cai e encontra o chão. Você não ouvirá o barulho, mas ele existe e já reverberou em seu coração.

Um lindo e poético final de semana.

 

Imagem: Site Britannica. Bashô (em pé), xilogravura de Tsukioka Yoshitoshi, final do século XIX. Biblioteca do Congresso, Washington DC.

(1) A Trama da Vida: como os fungos constroem o mundo” de Merlin Sheldrake -  Fósforo Editora – 1ºEdição.

Comentários

Postar um comentário

Obrigada, seu comentário é muito importante.
Caso vá comentar no modo anonimo, por favor assine seu comentário.

Obrigada pela participação.

As mais vistas

Inferno

Autor:  Dan Brown Tradutor: Fabiano Morais e Fernanda Abreu Editora:  Arqueiro Número de páginas:  448 Ano de Lançamento:  2013 (EUA) Avaliação do Prosa Mágica:   9                               Gênio ou Louco? Você termina a leitura de Inferno e continua sem uma resposta para esta pergunta. Dan Brown nos engana, muito, de uma maneira descarada, sem dó de seu leitor, sem nenhuma piedade por sua alma. O autor passa praticamente metade do livro te enganando. Você se sente traído quando descobre tudo, se sente usado, irritado, revoltado. Que é esse Dan Brown que escreveu Inferno??? Nas primeiras duzentas páginas não parece ser o mesmo que escreveu brilhantemente Símbolo Perdido e Código D’Vince.  Mapa do Inferno. Botticelli. Então, quando você descobre que está sendo enganado, assim como o brilhante Robert Langdon, a sua opinião vai se transformando lentamente, e passa de pura revolta a admiração. É genial a manipulação que Dan Brown consegue fazer c

Setembro

Autor:   Rosamund Pilcher Tradução: Angela Nascimento Machado Editora:  Bertrand Brasil Número de páginas: 462 Ano de Lançamento: 1990 Avaliação do Prosa Mágica:   10                         É uma história extremamente envolvente e humana que traça a vida de uma dúzia de personagens. A trama se passa na Escócia, e acontece entre os meses de maio a setembro, tendo como pano de fundo uma festa de aniversário que acontecerá em grande estilo. Violet, que me parece ser a própria Rosamund, costura a relação entre as famílias que fazem parte deste romance. Com destreza e delicadeza, a autora   nos conta o cotidiano destas famílias, coisas comuns como comer, fazer compras, tricô, jardinagem. Problemas pessoais como a necessidade de um trabalho para complementar a   renda e outras preocupações do cotidiano que surpreendem pela beleza que são apresentadas. É um livro em camadas, que pode ser avaliado sobre vários aspectos que se complementam. Pandora, por exemplo, é o

O Símbolo Perdido

Autor: Dan Brown Tradutor:   Fernanda Abreu Editora: Sextante Ano de Lançamento:  2009 Número de páginas:  490 Avaliação do Prosa Mágica: 10 Uau!! Cheguei ao fim com a impressão de ter ficado sem respirar por todas as páginas. O ano mal começou e já tenho um livro para a lista dos mais queridos de 2014. Não é possível que ele seja superado por outro. Você não precisa ser exatamente um amante de simbologia antiga, ou maçom para gostar da história, mas se for com certeza a trama terá mais sabor. Dan Brown desfila através das palavras todo seu talento em “fazer textos” que envolvem, prendem  e deixam marcas. Alias, a palavra é a tônica da trama. Mais uma vez Robert Langdom se mete em uma enrascada. Quando é supostamente chamado por um amigo para dar uma palestra em Washington, acaba descobrindo que foi usado para decodificar um antigo segredo ligado a maçonaria. A Pirâmide Maçônica, material de incontáveis sites e blogs na internet toma vida e as peças que pare

Seguidores