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Se um Viajante numa noite de Inverno

“Você vai começar a ler o novo romance de Italo Calvino, Se um viajante na noite de Inverno. Relaxe. Concentre-se. Afaste todos os outros pensamentos. Deixe que o mundo a sua volta se dissolva no indefinido.” Faça o que o autor manda, afinal de contas “você é o protagonista desta estória”.

Sorria, você acaba de entrar no mundo metalinguístico de Italo Calvino, e o que te espera ao longo das 278 páginas é uma mistura de boas tramas sem fim, ironia e a genialidade do autor que consegue, com alguns recursos, nos colocar dentro das páginas do livro. E quando você termina e fecha a capa tem a impressão de estar compartimentando algo dentro de você mesmo, como se o encerrar da estória faltasse algo de você mesmo lá.

Parece loucura? – Sim, é um livro que foge completamente do convencional.

São 10 romances inacabados ao longo de 10 capítulos duplos. Em um deles você protagoniza a trama, buscando incessantemente o exemplar completo de um livro, mas a cada um dos capítulos você descobre que ele não existe, que apenas outra trama surge na sua vida e que ela também não se completa. É um suceder de estórias formando um caleidoscópio  alucinado, cuja vida dos personagens foi colocada dentro de você mesmo, o leitor.

E, apesar de Calvino nos deixar 10 estórias geniais que não tem fim, em nenhum momento fica a sensação que ele quis apenas reunir ideias inacabadas em um único volume. Isso acontece porque elas se conectam de alguma forma, porque os personagens se travestem de outros, mas no fundo parecem ser os mesmos que buscam algo: - A busca incessante do viver.

Tem algo bem interessante que é a junção dos títulos dos capítulos, que acabam formando um parágrafo que conta também uma estória.

Se um viajante numa noite de inverno, Fora do povoado de Malbork, Debruçando-se na borda da costa escarpada, Sem temer o vento e a vertigem, Olha para baixo onde a sombra se adensa, Numa rede de linhas que se entrelaçam, Numa rede de linhas que se entrecruzam, No tapete de folhas iluminadas pela lua, Ao redor de uma cova vazia. Que história espera seu fim lá embaixo?

Mantive as vírgulas para separar os títulos, mas veja só como o parágrafo se completa, nos conta algo sobre alguém em um abismo que tem a coragem de olhar para baixo sem temor. Qual é o tipo de estória que nos aguarda? – Exatamente a que lemos ao longo do livro.

Existem muitos artigos sobre o livro feitos por estudiosos da língua e da literatura. Meu conselho é que não os leia. Se um viajante numa noite de inverno é para ser lido desprovido de tudo o que você conhece. Vá degustando cada parte, com a calma de quem experimenta algo muito novo em sua vida. Como um presente que não se espera, mas que se aprecia. Dispa-se dos conceitos e dos preconceitos existentes. Mergulhe no novo, sinta-se como o personagem, viva como se você estivesse sendo o próprio escritor da obra.

É um livro que eu indico para leitores avançados. Aquele leitor que já degustou o tradicional e agora quer conhecer algo de qualidade e diferente.

E você leitor, topa o meu desafio desta leitura?


Ítalo Calvino
foi um escritor e jornalista italiano. Um dos mais importantes escritores italianos do século XX. Nasceu em Cuba. Seus pais eram cientistas italianos que passavam uma curta temporada no país para depois retornar à Itália pouco tempo após o seu nascimento.

Estudou na Universidade de Agronomia apesar da vocação para as letras. Foi do Partido Comunista e também da Resistência Italiana.

Nasceu em 5 de outubro de 1923 e faleceu em 19 de setembro de 1985.

Principais obras: As Cidades Invisíveis; O Visconde Partido ao Meio; O Barão das árvores; O cavaleiro inexistente, dentre outras.

 

Autor: Italo Calvino

Tradutor: Nilson Moulin

Ano de lançamento: 1979

Editora: Companhia das Letras (2003)

Gênero: Romance Italiano

Páginas: 278

 

Foto do escritor: Oslo Museu.

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